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ATA DE REUNIÃO - AMAZON

Grupo de Estudos em Direito, Tecnologia e Inovação - DTI UFMG


Relatoras: Ana Luiza Marques e Julia D’Agostini



Amazon’s Antitrust Paradox

Lina Khan




Introduction

A autora inicia o texto expondo que, apesar de a empresa Amazon, no início de sua história, ter reportado perdas contínuas, atualmente inexistem dúvidas de que ela é a titã do comércio no século XXI, capturando 46% das compras online. Além disso, a Amazon é uma plataforma de marketing, uma rede de entregas e logística, um serviço de pagamento, uma concessora de créditos, uma casa de leilões, uma grande editora de livros, produtora de televisão e filmes, designer de roupas, produtora de hardware e uma provedora de servidores para armazenamento na nuvem e de capacidade computacional. Malgrado a empresa tenha tido um expressivo crescimento, ela apresenta lucros escassos, por escolher investir de forma agressiva, o que não impactou, contudo, os investimentos na companhia, que possui ações extremamente valorizadas.


As táticas de negócios utilizadas pela Amazon foram destacadas recentemente por jornalistas, em virtude de sua agressividade. Por exemplo, uma campanha denominada “The Gazelle Project” foi criada como uma estratégia em que a empresa abordaria pequenas editoras do mesmo modo que um guepardo se aproxima de uma gazela. Estes fatos possibilitaram um vislumbre acerca dos potenciais custos sociais da dominância da Amazon.


Em geral, há um crescimento da preocupação pública quanto ao fato de que a empresa se estabeleceu como uma parte essencial da economia digital e de que a sua dominância, em escala e abrangência, pode trazer perigos. Porém, destaca a autora que muitos dos críticos deixam de apontar como uma companhia que trouxe enormes benefícios para os consumidores e revolucionou o e-commerce poderia ameaçar o mercado.


Para Lina Khan, a história de dominância da Amazon coincide com a história de mudanças nas leis concorrenciais, pois, nas décadas de 1970 e 1980, o direito concorrencial passou utilizar os interesses a curto-prazo dos consumidores como um critério para a avaliação da competição. Desta forma, a queda dos preços é levada como uma evidência de concorrência saudável. E, neste aspecto, a Amazon obteve grande sucesso, porquanto direcionou sua estratégia comercial para a redução dos preços para os consumidores. Assim, a empresa alcançou o monopólio em consonância com as regras atuais de direito concorrencial.


Segundo a autora, entretanto, a análise da concorrência no mercado digital não pode levar em consideração apenas o bem-estar do consumidor, medido por meio dos efeitos a curto prazo nos preços e resultados, pois esta perspectiva deixa de capturar a arquitetura do poder de mercado no século XXI. Desta forma, torna-se necessária a análise das estruturas e dinâmicas de mercado subjacentes, de modo a avaliar o processo competitivo em si mesmo.



The chicago school revolution: the shift away from competitive process and market structure


Uma das mudanças mais significativas nas leis antitruste foi o afastamento da economia estruturalista. A Autora busca tratar neste capítulo inicial desta mudança de uma visão estruturalista para uma teoria de precificação.


A economia estruturalista se baseia na ideia de que a estrutura de mercados concentrada promove condutas anticompetitivas. Esta visão defende que um mercado dominado por um número pequeno de grandes empresas tende a ser menos competitivo do que um mercado composto por várias empresas de pequeno e médio porte. Este pensamento foi a base para o pensamento antitruste dos anos 1960.


A Escola de Chicago rejeitou esta visão, defendendo que a lente correta para enxergar problemas concorrenciais é a teoria da precificação.


Esta mudança de visão tem duas ramificações para a análise da concorrência. (1) Ela levou ao estreitamento do conceito de “barreiras de entrada”; e (2) os preços passaram a ser a métrica dominante para análise de concorrência.


Duas áreas de enforcement que foram afetadas com esta mudança de visão foram a ideia de preço predatório e integração vertical.


Predatory pricing

Em meados do século XX, o preço predatório era visto como uma tática utilizada por empresas para provocar a falência de suas concorrentes. Leis de proibição desta prática faziam parte de um arranjo de normas que buscava distribuir poder e oportunidade.


Contudo, uma decisão controversa proferida pela Suprema Corte em 1960 abriu as portas para críticos deste regime.


O caso mais antigo sobre preço predatório nos EUA foi o processo contra a Standard Oil, que rotineiramente reduzia seus preços como estratégia para expulsar seus concorrentes do mercado. Reconhecendo a ameaça desta prática, os EUA implementaram uma série de normas proibindo esta conduta.


As leis antitruste deste período demonstram que os EUA viam a prática de preços predatórios como uma grave ameaça para a concorrência. Ressalta-se, contudo, que nem todas as práticas que envolvem preços baixos era consideradas ilegítimas. A liquidação de bens em excesso ou perecíveis, por exemplo, era considerada legítima.


No caso Utah Pie Co. v. Continental Baking Co., a Suprema Corte americana reforçou a ilegitimidade da prática de preços predatórios. As duas empresas concorriam dentro do mercado de tortas congeladas. Uma vantagem de localização garantia à Utah Pie acesso mais barato ao mercado de Salt Lake City, vantagem aproveitada pela empresa para praticar preços mais baixos do que de seus competidores.


As demais empresas passaram a praticar preços abaixo do valor do mercado em Utah, mantendo seus preços usuais nos demais estados. A Utah Pie então alegou conduta anticoncorrencial da Continental Baking Co.. A Suprema Corte decidiu em favor da Utah Pie.


A decisão foi controversa, já que antes da prática de preços predatórios da Continental, a Utah Pie dominava quase 70% do mercado, passando a representar 45.3% do mercado após as medidas tomadas pelas concorrentes. Assim, a penalização de uma conduta que tornou o mercado mais competitivo representou uma excelente oportunidade para os críticos das leis vigentes.


A crítica da Escola de Chicago está na ideia de que a adoção da prática de preços abaixo do custo é irracional e raramente ocorre. Os críticos argumentam que não há garantia que a redução dos preços eliminaria empresas competidoras do mercado. Ainda que isso ocorra, os críticos defendem que o predador teria que manter o preço por tempo suficiente para recuperar suas perdas.


Com o crescimento da credibilidade deste pensamento, ele passou a influenciar as leis concorrenciais e passaram a moldar as decisões da Suprema Corte do período.


Vertical Integration

A integração vertical surge quando duas ou mais etapas sucessivas do processo produtivo ou distributivo de um produto estão sujeitas ao mesmo controle. Esta prática era banida sempre que representasse ameaça à concorrência. Contudo, a visão da Escola de Chicago é de que fusões verticais são vantajosas para a concorrência.


Conforme o “single monopoly profit theorem”, o lucro que uma empresa consegue extrair de um mercado é fixo é não pode se expandir com através da expansão para um mercado adjacente.


Why Competitive Process and Structure Matter

A Autora defende que as normas antitruste atuais falham no reconhecimento de certas práticas anticoncorrenciais. Esta deficiência é amplificada no contexto de plataformas online. Segundo Lina Khan, normas de concorrência devem promover não o bem-estar do consumidor, mas mercados competitivos.


Ao retomar a atenção para o processo e a estrutura, a concorrência verdadeira seria promovida, diferentemente do que ocorre no cenário criticado pela Autora.


Price and Output Effects Do Not Cover the Full Range of Threats to Consumer Welfare


Segundo a Autora, a doutrina moderna assume que o único propósito da concorrência é garantir o bem-estar do consumidor. Contudo, esta visão é muito restrita e trai a intenção do Congresso. A Autora defende que o surgimento de plataformas digitais dominantes revelam as deficiências deste pensamento. Inclusive, evidências crescentes mostram que esta visão resulta apenas em preços mais altos e menor eficiência, falhando suas próprias métricas.


Antitrust Laws Promote Competition To Serve a Variety of Interests


A história legislativa revela a ideia de que o Congresso designou o Sherman Act para promover o bem-estar do consumidor, está errada. Na realidade, as normas antitruste foram guiadas por princípios, buscando diversidade e acesso ao mercado, contra concentração e abuso de poder. Nesse sentido, focar o estudo da concorrência exclusivamente no bem-estar do consumidor é um erro e uma traição à intenção legislativa.


Promoting Competition Requires Analysis of Process and Structure


O fato de a Escola de Chicago enxergar o bem-estar do consumidor como único objetivo da concorrência é problemático em dois sentidos: Primeiro, como já abordado, pelo fato de esta visão contraria a história legislativa; Segundo, por mudar a ênfase analítica do processo para o resultado. Esta abordagem é inadequada para promover a concorrência, problema este ampliado no caso de plataformas online. Nesse sentido, a Autora propõe que uma melhor forma de compreender a concorrência é focando no processo concorrencial e na estrutura do mercado, principalmente quando se está tratando de plataformas online. Para a Autora, esta abordagem por meio da análise da estrutura e do processo permite uma avaliação da estratégia da empresa em questão e traz à tona aspectos anticoncorrenciais do negócio.



Amazon’s Business Strategy


A Amazon estabeleceu dominância como plataforma online graças a dois elementos estratégicos: A disposição para sustentar perdas e investimento agressivo em detrimento de lucro e a integração entre múltiplos setores.


Willingness To Forego Profits To Establish Dominance


A Amazon passou a reportar lucros consistentes recentemente, em grande parte em razão do sucesso de seus serviços de cloud computing. Contudo, na maior parte do tempo de atuação da empresa, a realidade era de perdas, e não de lucro. Contudo, investidores não deixaram de apostar na empresa.


A trajetória da empresa demonstra a filosofia de negócio estabelecida por Jeff Bezos, qual seja, a de estabelecer escala, priorizando o crescimento da empresa de maneira inicial. Assim, inicialmente a Amazon teve grandes perdas com produtos que posteriormente influenciaram seu crescimento, como o Amazon Prime.


O fato de a Amazon estar disposta a sacrificar seu lucro para atingir escala mina uma premissa central da doutrina do preço predatório, que assume que predação é irracional justamente porque empresas valorizam lucro em detrimento de seu crescimento. Nesse sentido, a estratégia da Amazon permitiu que ela utilizasse táticas de precificação predatória sem infringir leis antitruste.


Expansion into Multiple Business Lines


Outro elemento estratégico utilizado pela Amazon diz respeito à expansão agressiva em múltiplos setores. Além do comércio, a empresa trabalha com marketing, logística e delivery, serviço de pagamento, casa de leilão, editora de livros, produtora de filmes e televisão, designer de moda, fabricante de hardware etc.



Establishing structural dominance


Lina Khan passa, então, a descrever exemplos de condutas da Amazon que ajudam a ilustrar o modo como foi estabelecida a sua dominância estrutural e a maneira como a empresa pode usar o seu papel enquanto provedora de infraestrutura em benefício de seus outros empreendimentos. Os exemplos ilustram, ainda, como as barreiras de entrada podem tornar difícil a entrada de potenciais competidores nestas esferas, consolidando o domínio da Amazon em um futuro próximo.


Below-Cost Pricing of Bestseller E-Books and the Limits of Modern Recoupment Analysis


A Amazon entrou no mercado de e-book vendendo livros bestsellers abaixo do preço de custo. Esta estratégia de preço permitiu que a empresa estabelece o seu domínio neste mercado, sem que a conduta fosse reconhecida como anticompetitiva, pois o governo entendeu que o corte de custos seria caracterizado como “loss leader” e não como preço predatório. Igualmente, o dispositivo Kindle foi vendido abaixo de seu preço de produção.


O objetivo de Jeff Bezos, CEO da empresa, era dominar o mercado de e-book da mesma maneira que a Apple fez com as plataformas digitais de música. A estratégia funcionou e, em 2009, a Amazon já dominava o mercado de e-books, realizando 90% das vendas no setor.


As editoras, temendo que a política de preços da Amazon reduzisse os preços dos e-books de forma permanente, buscaram resgatar o controle e firmaram uma parceria com a Apple para a venda dos livros pela iBookstore, pela qual as editoras estabeleceriam o preço final das vendas e a Apple obteria um corte de 30%. Após a celebração do acordo, a editora MacMillan exigiu que a Amazon também adotasse este modelo de preços.

Em 2012, o Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DOJ) processou as editoras e Apple por conspirarem para o aumento do preço dos e-books e estas alegaram que foram as táticas predatórias da Amazon que ensejaram a união. O DOJ investigou as estratégias de preço da Amazon e concluiu não existirem evidências persuasivas acerca da prática de preços predatórios, pois teria obtido lucros consistentes com o negócio.


Este entendimento falha ao apreciar dois aspectos críticos das práticas da Amazon: (i) como os descontos excessivos de uma companhia em produtos de plataforma cria um maior risco de que a empresa gerará poder de monopólio e (ii) as múltiplas formas com que a Amazon poderia recompor as suas perdas sem que fosse necessário o aumento do preço dos mesmos e-books que receberam os descontos.


Em relação ao primeiro ponto, o governo dos EUA entendeu que a Amazon não realizava uma política de preços predatória porque, no agregado, o negócio de e-books era lucrativo. Esta perspectiva desconsidera o modo como grandes perdas em determinados nichos de e-books (como os bestsellers) podem frustrar a competição. Ou seja, o DOJ optou por definir o mercado relevante como e-books, ao invés de considerar as linhas específicas dentro do segmento, falhando em reconhecer como a economia de “produtos de plataforma” (platform-based products) se diferencia da economia linear. Assim, o mercado de e-books foi analisado da mesma forma que o mercado de livros físicos. Por esta razão, a prática foi classificada como loss leading e não como preço predatório, afastando-se o intuito de monopólio.


Todavia, a política de preços da Amazon reforçou e fortaleceu sua dominância no setor de um modo que não ocorreria no mercado de livros físicos, especialmente ao se ter em vista o “digital rights management” (DRM) e o fato de que a empresa, como outras vendedoras de e-books, limitam os tipos de dispositivo que podem ler certos formatos de e-book. Desta forma, a busca por livros baratos compele os leitores a comprarem o Kindle e, por conseguinte, continuarem a comprar e-books na Amazon, gerando um efeito de trancamento. Além disso, a busca de livros na plataforma da Amazon gera dados para empresa acerca dos hábitos de leituras e preferências dos usuários, os quais são utilizados para fornecer recomendações e concretizar vendas futuras. Esta lógica, replicada em diversas compras, fortalece o efeito de lock-in, tornando cada vez menos provável que o leitor compre e-books em outras vendedoras, mesmo que elas ofertem descontos.


Em outras palavras, a redução de preços fornece maiores retornos no e-commerce de plataforma, porquanto o valor marginal das primeiras vendas é muito maior para os e-books do que para os livros físicos, vez que existem efeitos de trancamento, tanto em razão do design técnico quanto das possibilidades e dos valores da personalização. E, de fato, as estratégias da Amazon consolidaram a sua dominação a longo prazo: ela controla cerca de 65% do mercado de e-books hoje e sua participação no mercado de e-readers é em torno de 74%.


A autora passa a analisar os modos como a empresa poderia recuperar as perdas geradas com a redução dos preços, destacando que a maneira mais óbvia seria o aumento de determinadas linhas de e-books ou de todo o setor. Todavia, esta análise no âmbito na Amazon enfrenta alguns desafios, pois os preços da empresa flutuam rapidamente e sem explicação. Deste modo, pode não ser aparente quando e como a companhia aumenta os preços, tendo em vista que o comércio online possibilita flutuações de preço rápidas e constante, além de possibilitar preços personalizados, o que pode ser feito, por exemplo, com o envio de cupons. Neste contexto, torna-se difícil aferir a escalada de preços para o propósito de recomposição das perdas.


Do mesmo modo, a recomposição pode ocorrer em outros mercados, especialmente em empresas que vendam produtos tão diversificados. Relatórios sugerem que a Amazon fez isso em 2013, com o aumento do preço de livros físicos escolares e de pequenas editoras. Além disso, a Amazon passou a cobrar por serviços que antes fornecia de graça, como o botão de pedido antecipado, a personalização das recomendações e a designação de um funcionário da Amazon para a editora, o que também é uma fonte de recomposição das perdas.


Outrossim, a pressão que a Amazon coloca sobre outras editoras deve ser levada em consideração. Em 2000, a indústria de editoras havia se consolidado nas “Big Six”, em virtude de vendas e fusões, o que reduziu a diversidade do mercado e prejudicou tanto os autores quanto os leitores. Com o crescimento da Amazon, as grandes editoras reduziram para cinco, com rumores de ainda maiores reduções. Ainda, o crescimento do preço de negócio com a Amazon está onerando o modelo de negócios das editoras, e ensejando uma redução da diversidade das publicações, fato este apontado por um grupo de autores, em uma carta para o DOJ.


Para a autora, a conduta da Amazon fere a diversidade de ideias no mercado de livros e acarreta riscos políticos, do ponto de vista da liberdade de mídia, de que a empresa venha, por exemplo, a retaliar livros que desaprove. E, mesmo da perspectiva do bem-estar do consumidor, a tentativa da Amazon de recompor perdas com a cobrança de taxas de editoras deveria ser compreendida como prejudicial, por reduzir a escolha dos leitores.


Acquisition of Quidsi and Flawed Assumptions About Entry and Exit Barriers


A Amazon também utilizou a prática de redução de preços para pressionar e adquirir uma grande rival. Este caso evidencia que, apesar da teoria afirmar que as barreiras de entrada para vendas online são baixas, na prática, são necessários investimentos significativos para estabelecer uma plataforma bem sucedida.


Em 2008, a Quidsi era uma das empresas de e-commerce com maior crescimento e que possuía diversas subsidiárias, especializadas em cuidados com o bebê, em produtos de casa e em produtos de beleza. A Amazon manifestou o interesse em adquirir a companhia em 2009, mas a oferta foi recusada. Após a recusa, a Amazon reduziu os preços de fraldas e outros produtos de bebê em até 30% e criou o serviço Amazon Mom, que oferecia uma série de descontos aos consumidores. Os executivos da Quidsi calcularam que a Amazon iria perder cerca de $ 100.000.000,00 (cem milhões de dólares) em três meses, apenas na categoria de fraldas.


Eventualmente, a política de preços da Amazon reduziu o crescimento da Quidsi e fez uma grande oferta para a aquisição da empresa, aceita pelos executivos da Quidsi. O FTC revisou a aquisição e decidiu que ela não trazia riscos anticoncorrenciais. Por meio da aquisição, a Amazon eliminou uma grande competidora no comércio online de produtos de bebês, por meio de redução de preços e aporte de dinheiro que uma companhia nova e menor, como a Quidsi, não seria capaz de manter. Após completar a aquisição, a Amazon aumentou os preços e cancelou a inscrição de novos membros no programa Amazon Mom e reduzindo os benefícios daqueles inscritos.


A conduta da Amazon contraria o pensamento contemporâneo sobre os preços predatórios não serem um caminho para a compra de competidores. Ademais, evidencia que o mercado de e-commerce não possui baixos custos de entrada, pois existem custos para criar uma nova plataforma online ou desenvolver uma marca forte o suficiente para atrair o tráfego de plataformas já existentes. Assim, as barreiras para entrada de plataformas digitais, de forma sustentável e bem sucedida, em realidade, são bastante altas, tendo em vista as grandes vantagens detidas pelo primeiro a adentrar no mercado, em virtude da coleta de dados e dos efeitos de rede. Por outro lado, as elevadas barreiras de saída não se aplicam aos mercados online, pois o investimento nestas plataformas repousa em bens intangíveis, como o reconhecimento de marca, que podem ser facilmente absorvidos por plataformas rivais.


Além disso, o uso de intimidação psicológica por parte dos predadores deve ser levado em consideração. No caso da Quidsi, a Amazon enviou uma clara mensagem aos seus potenciais competidores de que, salvo se eles tiverem recursos suficientes para injetar dinheiro no negócio e competir com a Amazon, pode não valer a pena entrar no mercado. E, mesmo após o aumento dos preços por parte da Amazon, nenhuma empresa nova tentou enfrentá-la neste setor, confirmando o fato de que a intimidação pode ser uma barreira na prática.


Amazon Delivery and Leveraging Dominance Across Sectors


A Amazon utilizou sua posição dominante nas vendas online para assegurar condições favoráveis de empresas de transporte, com a redução de taxas em 70%, o que permitiu que a Amazon estendesse a sua dominância sobre outras companhias, criando uma dinâmica anticompetitiva, pois as empresas de delivery buscaram compensar os descontos dados para a Amazon ao aumentar os preços de vendedores independentes.


Além disso, em 2006, a companhia introduziu o serviço de logística e delivery Fulfillment-by-Amazon (FBA), fornecido para vendedores independentes. Assim, ela se inseriu no negócio de seus competidores. A capacidade de investimentos agressivos da firma possibilitou o estabelecimento de uma grande rede de infraestrutura física, ensejando a redução do tempo de entrega das mercadorias e o aumento das barreiras de entrada.


Este é um exemplo de como a companhia pode utilizar a sua dominância em uma esfera para estimular uma outra linha de negócios, em virtude de seu poder de barganha. Neste caso, os grandes descontos obtidos pela Amazon de empresas de delivery (como a FedEx e a UPS) ensejaram o aumento dos preços para outras vendedoras, o que permitiu que a Amazon as capturasse como clientes de seu novo negócio.


Ademais, a Amazon está posicionada para utilizar sua dominância nas vendas online e no delivery de maneiras que envolvem amarras, são excludentes e criam barreiras de entrada. Ou seja, as distorções no setor de entregas criam desafios anticompetitivos no setor de vendas. Por exemplo, vendedores que usam o FBA tem maiores chances de serem listados antes daqueles que não utilizam o serviço, o que significa que a Amazon está amarrando os resultados que gera para os vendedores que utilizam sua plataforma de venda à utilização do serviço de delivery. Ainda, a Amazon consegue utilizar de sua logística e infraestrutura para entregar os seus produtos mais rapidamente do que o dos vendedores independentes que usam a plataforma, uma forma de discriminação que exemplifica as tradicionais preocupações com a integração vertical.


Igualmente, este exemplo levanta questões sobre a concepção da Escola de Chicago acerca das barreiras de entrada. Com efeito, a capacidade da companhia de suportar prejuízos foi o que permitiu que a Amazon alcançasse este grande crescimento no setor de logística e entregas. Equipar-se à rede da Amazon exigiria grandes investimentos e remessas grátis ou abaixo do custo. Desta forma, a habilidade de sustentar perdas criou uma barreira para qualquer outra empresa que não detenha o mesmo privilégio.


Por fim, a criação do FBA exemplifica como a companhia se colocou no centro do e-commerce, tornando claro que, para suceder no setor, um vendedor independente necessitará utilizar a infraestrutura da Amazon. O fato de que a Amazon compete com muitas das empresas que dependerão de seu serviço de entregas cria um conflito de interesses que a companhia pode explorar para favorecer os seus próprios produtos.


Amazon Marketplace and Exploiting Data


Uma dinâmica análoga à integração vertical com o serviço de delivery está ocorrendo com a Amazon e sua dominância na provisão de infraestrutura online, em particular, o seu Maketplace, onde outras empresas vendem suas mercadorias. Como a Amazon comanda grande parte do tráfego de e-commerce, muitos comerciantes necessitam de sua plataforma para atrair compradores, pagando taxas de 6% a 50% de suas vendas para a empresa, que também é concorrente destes comerciantes.


Desta forma, a Amazon utiliza o Marketplace como um laboratório para selecionar novos produtos para vender e testar a venda de novos produtos e relatórios sugerem que a empresa utiliza dados das vendas para tomar decisões sobre as compras e superá-los nos preços - seja indo diretamente ao produtor ou passando a produzir o produto por conta própria. Após a empresa passa a fornecer aos seus próprios produtos um lugar de destaque nas pesquisas na plataforma.


Segundo Linda Khan, a Amazon consegue proceder deste modo em grande escala e com sofisticação, monitorando dados das vendas, mas também de produtos buscados e não encontrados pelos usuários, produtos que são recorrentemente adquiridos, as mercadorias que ficam na cesta de compras e os produtos em que o mouse para por um período.


Assim, o Marketplace permite que a Amazon aumente suas vendas ao mesmo tempo em que reduz seus riscos, porquanto são os comerciantes que suportam os custos iniciais e as incertezas ao introduzir um novo produto. Deste modo, fica clara a conduta anticompetitiva neste caso, vez que a Amazon está explorando o fato de que alguns de seus clientes são também seus concorrentes. A fonte deste poder está em sua dominância enquanto plataforma; sua integração vertical; e sua habilidade de analisar grandes quantidades de dados, por ser uma companhia de internet.



How platform economics and capital markets may facilitate anticompetitive conduct and structures


A autora inicia o tópico expondo que economistas têm analisado o modo como mercados de plataforma podem representar desafios únicos na análise antitruste. Especificamente, eles ressaltam que a análise aplicável a firmas em mercados unilaterais pode não funcionar em mercados bilaterais. Deste modo, os economistas tendem a concluir que, dadas as particularidades dos mercados bilaterais, o antitruste deve ser conivente com condutas que, em outro contexto, poderiam ser caracterizadas como anticompetitivas.


Segundo Lina Khan, um dos fatores mais relevantes em mercados de plataformas online é que os vencedores levam tudo, em razão do efeito de rede e do controle de dados, que fazem com que as vantagens iniciais se reforcem ao longo do tempo. O resultado é que um mercado de plataformas tecnológicas será dominado por um pequeno número de firmas.


Neste contexto, uma empresa que busque competir nestes mercados deve buscar capturá-los. A maneira mais efetiva é perseguir a fatia de mercado e expulsar o rival, ainda que isso signifique o sacrifício de lucros a curto prazo. Em razão desta dinâmica, esforços para aumentar a participação no mercado às custas dos concorrentes torna a predação algo extremamente racional.


Destaque-se que apesar destas companhias de plataforma, como a Amazon e a Uber, suportarem consistentes e exorbitantes prejuízos para atrair usuários, elas contam com grande suporte dos investidores, sugerindo que há uma expectativa de recuperação das perdas. Essa estratégia, contudo, ainda não foi reconhecida pela doutrina antitruste. Igualmente, o modo como as plataformas recompõem seus prejuízos não é devidamente considerado na contemporaneidade.


A conduta da Amazon sugere que os preços predatórios e integração entre diferentes linhas de negócios está emergindo como um dos principais caminhos para estabelecer a dominação, auxiliada pelo controle dos dados que as plataformas dominantes detêm.


Nesse sentido, as características únicas dos mercados de plataforma exigem uma avaliação mais minuciosa do modo de aplicação do antitruste.



Two models for addressing platform power


Existem duas aproximações possíveis para o problema e, para isso, precisamos decidir se pretendemos governar os mercados de plataformas online por meio da concorrência ou se aceitaremos que eles são intrinsecamente monopolistas ou oligopolistas e buscaremos regulá-los. No primeiro caso, deveríamos reformar as leis antitruste para evitar que a dominância seja formada ou limitar o seu escopo. No segundo, deveríamos adotar regulações para obter vantagens da economia de escala ao mesmo tempo em que neutralizamos sua habilidade de explorar a sua posição dominante.


Governing Online Platform Markets Through Competition


Envolve tornar as leis contra os preços predatórios mais robustas e fiscalizar as formas de integração vertical que podem ser utilizadas pelas companhias para finalidades anticompetitivas.


No que tange aos preços predatórios, a autora aponta que, embora eles permaneçam ilegais, na prática é muito difícil vencer essas demandas, porque as cortes exigem provas de que o alegado predador seria capaz de aumentar preços e recuperar seus prejuízos. Assim, a teoria dos preços predatórios teria que ser revisitada para refletir a economia dos mercados de plataforma, onde firmas podem despender dinheiro por anos com o apoio ilimitado dos investidores. Deste modo, o requisito da recuperação de prejuízos teria que ser abandonado.


Lina Khan sugere, ainda, a introdução de uma presunção de práticas predatórias por parte das plataformas que vendam seus produtos abaixo do preço de custo, pois (i) as empresas podem aumentar os preços muitos anos após a prática dos preços predatórios; (ii) as perdas podem ser recompostas em outros bens relacionados; (iii) o aumento dos preços pode se dar por meio da prática de preços personalizados ou discriminatórios, dificultando a detecção.


Do ponto de vista do bem-estar do consumidor, estas condutas são prejudiciais pois incluem a degradação da qualidade do produto e a redução da diversidade de escolha. De um ponto de vista mais amplo, os males potenciais incluem salários mais baixos para os empregados, menores taxas de criação de negócios, menores índices de propriedade local e um grande controle político e econômico nas mãos de poucos.


A introdução de uma presunção de comportamento predatório demanda a identificação de preços abaixo do custo, o que é um assunto de grande debate. A Suprema Corte dos EUA ainda não enfrentou a questão, mas alguns tribunais já consignaram que o custo variável médio é o critério adequado. Contudo, importante considerar que o custo relevante pode variar dependendo da indústria ou da estrutura de custo.


Para a autora, entretanto, uma definição específica de custo se torna menos relevante se o teste para os preços predatórios permitir a defesa da empresa, o que ajudaria a identificar os falsos positivos. As justificativas apresentadas pelas companhias poderiam abranger a compensação do comprador por assumir o risco de adquirir um novo produto; a expansão da demanda a um nível que permitiria a entrada à economia de escala; a manutenção dos preços em um nível competitivo, enquanto se aguarda a queda dos preços; e se equiparar às competidoras.


A análise de quais plataformas seriam grandes o suficiente para atrair a presunção poderia ser feita de acordo com a sua participação no mercado, medido em níveis de controle local e não apenas nacional.


Em relação à integração vertical, a autora sugere a análise minuciosa de fusões que possibilitam a aquisição de dados valiosos e sua utilização cruzada para alavancar serviços. Por exemplo, agências deveriam automaticamente rever qualquer negócio que envolva a troca de certas formas ou quantidades de dados. Nesta perspectiva, a compra do WhatsApp e do Instagram pelo Facebook teria sido melhor analisada pelas agências antitruste, a partir do reconhecimento de que a aquisição dos dados pode impactar enormemente a competição.


Além disso, Lina Khan menciona como possível medida a ser tomada o banimento profilático de fusões que poderiam ensejar conflitos de interesse, como uma forma de impor limites à integração vertical, partindo da concepção de que o envolvimento de uma plataforma em múltiplos nichos relacionados de negócios pode ensejar conflitos de interesse ao criar circunstâncias em que uma plataforma é incentivada a privilegiar o seu próprio negócio em detrimento das competidoras. Desta forma, impedir as estruturas industriais que permitem este conflito de interesse pode ser mais efetivo do que fiscalizar estes conflitos, como já é feito na regulação dos bancos.


Governing Dominant Platforms as Monopolies Through Regulation


A outra alternativa é governar as plataformas dominantes com a regulação do poder destas plataformas. Considerando que a Amazon crescentemente fornece uma infraestrutura essencial na economia de internet, possível a aplicação de elementos da regulação de utilidade pública, como a vedação aos preços e serviços discriminatórios; a imposição de limites na estipulação de taxas; imposição de exigências de capitalização e investimentos.


No caso da Amazon, a primeira política apontada (não discriminação) parece ser a de maior sentido e de mais fácil implementação. Uma política de não discriminação que proibisse a Amazon de privilegiar os seus próprios bens e de discriminar produtores e consumidores seria significante, tendo em vista que grande parte das preocupações anticompetitivas em torno da empresa decorrem da integração vertical e do decorrente conflito de interesses.


Na prática, a implementação deste regime de regulação pode ser desafiadora, pois críticas a este modelo de regulação ensejaram a redução do próprio conceito de utilidade pública, evidenciando uma tendência de não interferência. Existe, porém, um movimento para a aplicação de uma regulação análoga a serviços como a internet, como se vê, por exemplo, nos debates sobre a neutralidade de rede.


Uma versão mais leve da visão regulatória seria a aplicação da doutrina das facilidades essenciais (essential facilities doctrine), que impõe o compartilhamento de requerimentos de ativos naturalmente monopolizados que servem de entrada em outros mercados. Esta doutrina aceita a consolidação da propriedade, mas reconhece que um monopolista integrado verticalmente pode negar acesso aos rivais em mercados adjacentes, de modo que o monopolista no controle da facilidade essencial deverá garantir aos competidores um fácil acesso.


Uma facilidade é essencial e deve ser partilha se quatro condições estão presentes: (i) um monopolista controla a facilidade essencial; (ii) o competidor é incapaz de duplicar a facilidade essencial; (iii) o monopolista está negando o uso da facilidade por parte do competidor; e (iv) o fornecimento da facilidade é possível. A Amazon encaixa nos fatores ii, iii e iv, sendo que o primeiro está sujeito ao risco de que a doutrina adote uma posição muito restritiva do que constitui um monopolista. Como a companhia controla infraestrutura determinante para o e-commerce, impor um dever de permitir o acesso à infraestrutura em uma base não discriminatória faz sentido.



Conclusion


Em sua conclusão, a autora afirma que as plataformas de internet mediam uma grande e crescente parte de nosso comércio e comunicação. Apesar disso, evidências demonstram que a competição neste mercado está enfraquecendo, com a dominação de um ou dois gigantes. A Amazon construiu a sua dominância no e-commerce de forma agressiva, abrindo mão dos lucros, e consolidou a sua integração em diversas linhas de negócio relacionadas, ensejando preocupações do ponto de vista da concorrência, que não foram devidamente apreciadas pelo direito concorrencial.


Os riscos de preços predatórios e de anticompetitividade oriunda da integração entre diversos ramos de negócio não foram devidamente considerados. Para isso, em um contexto de mercado de plataforma, a preocupação com o bem-estar do consumidor deve ser substituída para uma análise orientada pela preservação dos processos competitivos e das estruturas de mercado.


Nesse contexto, revistar os princípios de antitruste para criar uma presunção de predação e banir a integração vertical por parte de plataformas dominantes poderia ajudar a manter a competição nestes mercados. Por outro lado, caso aceitemos as plataformas dominantes como monopólios ou oligopólios naturais, podem ser aplicados os elementos de uma regulação de utilidade pública ou das obrigações decorrentes da doutrina das facilidades essenciais.

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