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O POTENCIAL DA ARBITRAGEM E DA MEDIAÇÃO NA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS DE DIREITO E TECNOLOGIA

Por Marina Moretzsohn Chust Trajano




Já nos primórdios das civilizações romanas, um dos mais antigos institutos do Direito apresentava-se como essencial para a resolução de conflitos - a arbitragem, sendo facultativa se contratualmente estabelecida pelos litigantes e necessária ao longo da atividade judicial. O organismo do método arbitral, nessa conjuntura, encontrava-se registrado na Lei das Doze Tábuas e é mais um dos pontos de evidência da relevância de Roma como centro de difusão cultural do Ocidente. No contexto social vigente no Brasil, métodos alternativos de resolução de conflitos como a arbitragem e a mediação vêm ganhando cada vez mais espaço em diversas áreas, dentre as quais se destaca o Direito e Tecnologia. Contudo, salienta-se que a desinformação a respeito desses métodos apresenta-se como um entrave para sua expansão, e por isso, faz-se necessária a difusão de informação a respeito do tema. Neste artigo, pretende-se analisar o uso da mediação e da arbitragem na área do direito tecnológico, que pode se dar desde os desafios regulatórios aos impactos da automação jurídica.


Em primeira análise, antes de adentrar nas especificidades da área do Direito e Tecnologia, é relevante destacar a definição de mediação como um procedimento autocompositivo, uma vez que o acordo é entre as próprias partes. Assim, o mediador deve atuar como um terceiro neutro, não podendo impor uma solução para a lide. Já a arbitragem é caracterizada como método heterocompositivo, considerando que o conflito é administrado e possivelmente solucionado por terceiros. Ainda, cabe ressaltar que a sentença proferida pelo árbitro é equivalente à do juiz, sendo considerada como título executivo judicial.


Em segunda análise, é relevante destacar que é natural a migração para métodos alternativos de resolução de conflitos em um cenário em que, confrontando dados do Conselho Nacional de Justiça e do censo demográfico do IBGE, constata-se que, estatisticamente, todo brasileiro adulto é parte de um processo. Esse fato faz com que magistrados recebam demandas processuais muito além do que podem suportar, o que, muitas vezes, compromete o trabalho de juízes. Por outro lado, os árbitros e mediadores costumam lidar com uma quantidade de litígios muito menor, o que permite uma abordagem mais cautelosa de cada causa.


Nesse aspecto, outro grande diferencial é o caráter especialista dos árbitros, em contraposição ao generalismo da atuação da magistratura. No que tange aos conflitos relacionados ao campo da tecnologia, é muito relevante que a jurisdição seja dada por alguém que disponha de domínio na temática, e, por isso, a arbitragem tende a ser muito eficaz.

Além disso, a busca por métodos alternativos de resolução de conflitos representa um fator favorável à economia brasileira por promover a descentralização da justiça no Governo. Em 2019, o Brasil gastou 1,5% do PIB com o Judiciário, enquanto países como Venezuela e Estados Unidos gastaram 0,34% e 0,14%, respectivamente. Na conjuntura vigente de risco fiscal no país, que conta com um déficit primário desde 2014, é essencial que haja uma redução do gasto governamental com o setor.


É pertinente, também, abordar aqueles aspectos que se mostram como entraves à adesão desses métodos. Dentre esses obstáculos, se destaca a falta de conhecimento a respeito da legislação que rege essas modalidades extrajudiciais de composição da lide. Embora a mediação não possua lei específica, como a arbitragem, é aplicada de acordo com a Constituição. José Delgado destaca no preâmbulo da Constituição Federal a afirmação de constitucionalidade do método. Segundo o autor, a expressão "solução pacífica das controvérsias" é prerrogativa para outras práticas de resolução de conflitos.


Ainda, faz-se importante destacar os conflitos oriundos do uso de Inteligência Artificial na área médica, cuja maioria se origina em decorrência da baixa formalização dos contratos de trabalho médicos. As prestações de serviços nesse setor são realizadas, habitualmente, de forma verbal. Como consequência, a maioria dos pacientes que litiga contra médicos são motivados por falhas de comunicação. Nesses casos, é evidente a adequação da mediação, método que, além de buscar ser livre de alguns aspectos, formais, rígidos e extremamente burocráticos, conta com uma leitura psicanalítica e psicológica do conflito que inexiste em abordagens restritas ao ponto de vista jurídico. Assim, o mediador, por meio de uma escuta ativa, da identificação de falhas e ruídos na comunicação, da eliminação da negatividade da discussão e da formulação de visões de futuro, tenta criar um ambiente de reconhecimento, reparação, respeito, empatia e confiança. A confiança deve ser destacada mediante o princípio da voluntariedade - que é um dos norteadores do procedimento, assegurando adesão voluntária à mediação, assim como a assinatura de um eventual acordo - e do princípio da confidencialidade, que, com fulcro no art. 207 do Código de Processo Penal e no art. 406 do Código de Processo Civil, garante o sigilo sobre os fatos abordados no procedimento e a proibição do mediador prestar testemunho em processo judicial que envolva a causa.


Tem-se, ainda, considerável quantidade de litígios na área do direito tecnológico que se originam em decorrência de desafios regulamentares. Como exemplo, pode-se citar a interseção entre Direito e robótica, que, constituindo o Robo-Law e o Cyber-Law, traz questionamentos a respeito do ponto de equilíbrio entre a responsabilização sobre as novas tecnologias e a possibilidade do desenvolvimento tecnológico.


Assim, na propositura de um novo olhar sobre o litígio, prezando pela continuidade do relacionamento social entre as partes, a mediação se apresenta como uma boa alternativa para solucionar conflitos entre no meio do direito tecnológico, garantindo a manutenção de vínculos empregatícios, societários e cooperativos, além da continuidade de prestações de serviços que beneficiem ambas as partes. Para isso, conta-se com o princípio da boa fé, pelo qual busca-se a superação da lógica do perde-ganha, ou seja, a troca de acusações entre as partes e a ideia de que um acordo é algo negativo.


Destaca-se, ainda, que o uso da mediação e da arbitragem tem ganhado especial relevância no contexto de ascensão da Inteligência Artificial na área médica. Esse uso levanta diversas questões, como a da responsabilidade civil dos erros médicos em caso de procedimentos realizados por máquinas. A complexidade dessas questões ainda tão novas demanda uma resolução célere, imparcial e que conte com profissionais especialistas, além de um elevado grau de confiança das partes como garantem os métodos aqui abordados. Os casos já analisados na área apontam eventuais efeitos nocivos de uma má compreensão sobre as novas tecnologias, seja em relação a seu funcionamento ou sobre quais valores elas ameaçam - evidenciando a importância do especialista.


Além disso, outra discussão relevante dentro deste tema é levantada por Froomkin, Kerr e Pineau (2018), que apontam possíveis efeitos jurídicos da utilização da Inteligência Artificial na medicina, incluindo o desenvolvimento de uma "monocultura diagnóstica", que consiste em uma padronização, a ser aceita pela medicina e pelo direito, de abordagens mecanizadas de diagnósticos médicos. Esse tipo de padrão pode reduzir os litígios decorrentes de erros médicos, além de aumentar a assertividade de decisões tomadas por árbitros que dominem as interdisciplinaridades entre direito e medicina.


Por fim, diante de todo o exposto, apresenta-se evidente o grande potencial de eficácia e assertividade do uso da mediação e da arbitragem como métodos de resolução de conflitos na área do direito tecnológico. Assim, é importante que os institutos jurídicos que as sustentam, utilizados por séculos pelas sociedades humanas, sejam cada vez mais utilizados - auxiliando no combate à saturação do judiciário brasileiro e beneficiando desde as partes envolvidas no conflito até a recuperação do equilíbrio fiscal da economia brasileira.


Referências Bibliográficas


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HADDAD, Carlos. Fácil de entrar, difícil de sair - o desafio de gestão do judiciário. Palestra proferida no TEDx, Nova Lima/MG. Disponível em: <https://www.ted.com/talks/carlos_haddad_facil_de_entrar_dificil_de_sair_o_desafio_de_gestao_do_judiciario>. Acesso em: 20.12.2020.


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